Saiba tudo sobre mútuo conversível – o contrato de investimento mais usado no mercado

26/5/22

O mútuo conversível é, sem sombra de dúvidas, o contrato mais usado quando o assunto é investimento em empresas, em especial em empresas inovadoras.

Ele consiste em um mútuo convencional, no qual o investidor concede uma quantia a título de empréstimo à empresa, com prazo e juros definidos. A grande diferença, contudo, reside na possibilidade que o investidor tem de converter o mútuo em participação societária e, por isso, falamos que ele é um contrato híbrido (comercial e societário).

Em outras palavras, o valor dado a título de empréstimo pode ser convertido, futuramente, em quotas ou ações da empresa investida. Isso significa que o investidor não entra imediatamente como sócio da empresa, evitando formalidades como as alterações no contrato social e se afastando das responsabilidades tributárias e trabalhistas, por exemplo.

É, portanto, um contrato com duas fases diversas: primeiramente, há um empréstimo, e, na sequência, a possibilidade de cobrar o valor emprestado, ou convertê-lo em participação societária.

1. Quais são as vantagens do mútuo conversível?

a) Simplicidade: no sentido que não exige registro ou maiores formalidades para a execução do contrato. O que o torna, também, mais ágil, principalmente se comparado com a aquisição direta de quotas.

b) Liberdade: os contratantes terão maior liberdade para dispor sobre as cláusulas contratuais, já que estarão menos atrelados às amarras legais, como em outros contratos de investimento (Contrato de Participação).

c) Proteção ao patrimônio: como o contrato é, inicialmente, um mútuo comum, o investidor ficará na condição de credor da sociedade. Logo, seu patrimônio ficará protegido de eventuais dívidas trabalhistas e fiscais da empresa.

d) Opção pelo SIMPLES: não há impedimento para que a sociedade seja optante do Simples Nacional.

e) Baixa tributação: desde que feito um planejamento tributário adequado. Isso porque, geralmente ocorrerá a transformação da startup de limitada para S/A, e, assim, o ágio, que é a diferença entre o valor contábil das ações ou vendidas e o seu valor real, não será tributado.

2. E as desvantagens?

Em que pese seja uma operação segura e bastante usada no mundo dos negócios, em especial nas startups, o contrato de mútuo conversível acaba vinculado a alguns riscos, como qualquer outro contrato.

a) Insegurança jurídica: o mútuo conversível, como dito anteriormente, é um contrato híbrido. Ele, enquanto apenas contrato de empréstimo, é típico (tem previsão na Lei). Contudo, no que pese a sua alternativa de cumprimento (conversibilidade), não há nenhuma previsão legal que a regulamente de forma específica (a lei apenas prevê a possibilidade de cumprimento alternativo da obrigação), de forma que as leis que lhe serão aplicadas são genéricas e voltadas para o mútuo comum.

O problema, na realidade, está na dificuldade de prever como o Poder Judiciário reagirá caso lhe sejam apresentadas questões sobre, principalmente, a relação do investidor e dos sócios da empresa investida, pois há uma linha muito tênue entre até que ponto aquela relação é, a princípio, apenas comercial (credor/devedor) ou societária (relação entre sócios), o pode causar divergências de interpretação.

Contudo, um contrato bem redigido, de acordo com as regras do mercado e com as decisões dos tribunais, cujas cláusulas reflitam a realidade e observem os princípios gerais dos contratos, é a única – e melhor – forma de se proteger dessa insegurança.

b) Aumento do passivo: sob a ótica da empresa, a principal desvantagem será o aumento do passivo, pois, como já foi dito, ao contratar um mútuo conversível, a empresa assume a obrigação de devolver o valor que lhe foi emprestado, com o acréscimo de juros (mesmo que esse não seja o objetivo principal das partes).

Então, embora esse empréstimo possa ser convertido em participação societária, a critério do credor, a empresa assume, em um primeiro momento, a obrigação de pagar a dívida.

c) Complexidade do Cap Table: cap table, nada mais é do que uma tabela de classificação da participação societária de cada sócio, investidor ou colaborador na empresa.

Por isso, ao se contratar um mútuo ou qualquer outro contrato conversível, os sócios e os investidores precisam manter a tabela de participação sempre atualizada para o acompanhamento das conversões e principalmente das diluições.  

Fonte da imagem: www.basement.io

d) Possibilidade de responsabilidade do investidor: embora tenha se apontado como uma das vantagens do mútuo a proteção ao patrimônio do investidor, é importante que se saiba que se houver casos de ingerência, ou seja, se o investidor extrapolar e tentar interferir demais nas questões internas da empresa, a relação pode ser caracterizada uma sociedade de fato, descaracterizando o mútuo e impondo responsabilidade de sócio ao investidor.

3. O que acontece quando o mútuo vencer?

Será necessário, primeiramente, analisar o momento da sociedade: se as metas foram atingidas, o investidor poderá optar pela conversão do mútuo em participação societária e cumprir o objetivo inicial do contrato. Nada impede, porém, que ele opte por receber o valor corrigido, tendo em vista que se trata de um empréstimo, com a possibilidade de conversão.

Poderá, também, prorrogar o prazo por mais algum tempo, caso entenda que a sociedade não atingiu a maturidade esperada e, para isso, precisará de mais tempo.

O problema será quando a sociedade não tiver a performance esperada. Nesse caso, o investidor poderá:

a) Renovação do mútuo: caso entenda que a sociedade poderá dar o retorno desejado, precisando apenas de mais tempo.

b) Retirada do negócio: o investidor poderá se retirar, sabendo que, nesse caso, dificilmente receberá o valor que foi emprestado, assumindo, assim, os riscos do investimento.

c) Converter o mútuo: é uma situação incomum, já que a empresa não deu o retorno esperado, mas nada impede que seja feito.

d) Novo investimento ou abertura para investimentos externo: no caso de se entender que a empresa não prosperou por falta de recursos, abrindo-se, assim, para novas rodadas de investimento.  

e) Execução do valor emprestado: também é uma situação incomum, já que a sociedade não deu os frutos que se esperava, mas, em todo o caso, o investidor tem um título executivo contra a sociedade e nada o impede de executá-lo.

Porém, como já foi dito, as partes têm grande liberdade para definir como será o seu contrato de mútuo conversível, e poderão acabar optando por uma solução diferente dessas citadas, embora essas sejam as mais comuns.  

4. Principais aspectos jurídicos do contrato de mútuo conversível

a) Condições para a cobrança do mútuo: como já foi dito, a conversão do empréstimo em participação é uma possibilidade, logo, a empresa deve sempre ter em mente que contraiu uma dívida ao aceitar o mútuo.

Portanto, o contrato deve prever todas as condições para pagamento, incluindo a taxa de juros e correção que será aplicada, o prazo para pagamento, assim como qualquer outra informação que seja pertinente, sob pena de descaracterização do contrato de mútuo conversível.

b) Valor e forma de aporte: assim como dito acima, todas as questões referentes ao aporte (valor, prazo, se será parcelado ou à vista etc.) devem ser descritas no contrato.

c) Conversão e eventos de liquidez: seguindo a mesma linha dos parágrafos anteriores, não poderia ser diferente para a conversão, que é o objetivo principal do contrato. É imprescindível que o contrato seja específico sobre as questões que cercam a conversão: forma de notificação da vontade do investidor, métricas para o cálculo do valuation, prazo para manifestar essa vontade, eventuais condições e garantias para a conversão, prazo para transformação da empresa em sociedade anônima – se for o caso, entre outros.

Também será necessário que o contrato traga o prazo de duração do mútuo, assim como as hipóteses de vencimento antecipado e os eventos de liquidez, isso é, os eventos que podem alterar a estrutura da sociedade e, por conseguinte, que autorizarão o investidor a antecipar sua decisão sobre a conversão ou não.

d) Definição de valuation: valuation é a definição do valor da empresa. Assim, é importantíssimo que as partes estipulem como esse cálculo será feito.

e) Cláusulas de administração e gerência: embora esse tipo de cláusula costume se fazer presente já nos contratos anteriores ao do mútuo, como o term sheet (pré-contrato), não podem deixar de fazer parte no contrato definitivo.

Isso inclui o momento anterior à conversão – quando o investidor ainda é só um investidor – e o momento após a conversão, quando passará a ser sócio.

É preciso que haja equilíbrio nas definições dessas regras, principalmente quando se fala do momento anterior à conversão, sob pena de descaracterizar o mútuo conversível.

5. Conclusão

Existem muitas outras cláusulas que poderiam aparecer neste artigo, pois há muitas questões sobre o mútuo que são interessantes e merecem atenção na hora de se optar por essa modalidade de investimento. Contudo, o nosso objetivo aqui é apresentar as vantagens, desvantagens e os cuidados que as partes devem ter com esse contrato.

Logo, em razão das consequências que um acordo mal redigido pode causar para as partes (empresa, sócios e investidor), é indispensável que se contrate uma assessoria jurídica especializada para acompanhar esse processo de investimento.

Portanto, se sua empresa está nessa fase e você, como sócio, deseja ter uma maior segurança jurídica na operação ou, ainda, se você é um investidor e deseja se proteger, conheça mais o nosso trabalho acessando outros artigos do nosso blog e marque uma consulta, nos enviando uma mensagem por aqui.

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